Beatriz Russo*
Desde 1824 cientistas sabem sobre o efeito estufa e nossa potencial influência no aumento da temperatura do planeta. Ao fim do mesmo século, foram as descobertas do químico sueco Svante Arrhenius sobre a relação entre o dióxido de carbono e a ampliação do efeito estufa que fizeram soar os alarmes sobre os caminhos que a industrialização tomava e sua interferência na atmosfera. Ali se iniciava uma tradição em pesquisas e coleta de dados climáticos – que já ultrapassam 150 anos – e que foi fundamental para que ganhássemos um conhecimento mais sofisticado sobre os efeitos de nossas ações sobre a vida por aqui. De lá pra cá, uma série de figuras surgiram, a fim de alertar a humanidade sobre o problema em que tínhamos nos metido. O ambientalista chegou traduzindo o conhecimento científico a um público mais amplo. Indivíduos – já despertos para o problema – passaram a adotar um estilo de vida mais equilibrado com a natureza e a repensar suas escolhas. Profissionais participantes de um sistema produtivo em colapso passaram a utilizar sua influência como forma de fazer reverberar a consciência ecológica. Empresas já começam a nascer com um DNA sustentável, outras lutam com êxito para se despir das conhecidas estratégias de greenwashing e a trabalhar de forma efetivamente responsável. Governos iniciaram a construção de políticas para a redução do efeito estufa e aumento do cuidado com os recursos naturais. Estudamos, alertamos... parece que fizemos muito. Mas ao ponderar o tamanho do problema e do envolvimento e participação de nossa aldeia global na busca por sua solução, arrisco: fizemos algo próximo a nada.
Percebendo a dificuldade dos governos em se organizar para resolver um problema comum a todos, organizações mundiais tomaram as rédeas dos debates acerca das mudanças climáticas. A ONU, talvez a maior catalizadora de pesquisas e debates climáticos desse período, foi categórica em seu relatório de 2013 ao afirmar que a mudança climática é real e nós somos a sua principal causa. Já ao final da década, no relatório do ano passado, resume suas análises climáticas em uma mensagem muito objetiva: é preciso agir agora. Mas, confiando em sua estimativa de que temos 11 anos para prevenir os danos irreversíveis que causamos ao planeta, como atacaremos este problema na próxima década?
Neste cenário apocalíptico surge a figura de Greta Thunberg, jovem ativista colocada no posto de ‘porta-voz do futuro’ ao longo de apenas um ano. No último painel climático da ONU, sob o foco das lentes mundiais, Greta comanda: “Eu não quero que você tenha esperança. Eu quero que você entre em pânico. Eu quero que você sinta o medo que eu sinto todos os dias. Então eu quero que você aja... Eu quero que você aja como se sua casa estivesse pegando fogo. Porque ela está”. Em um discurso intergeracional, Greta chega como a última profeta da década, chamando a atenção de uma espécie em relação à sua perenidade. Exigindo mudanças por meio de uma crua narrativa emocional – mecanismo importante para a promoção de novos comportamentos – a jovem Greta se articula com qualidade frente a uma espécie que não cresceu, que não aprendeu a limpar o próprio traseiro. Para um dia chegarmos em um futuro possível, a próxima década exigirá uma humanidade capaz de se reconhecer como espécie, como um grupo em busca de sua própria emancipação.
*Coordenadora do re_LAB da ESPM
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